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Autor: Flávio Braun Fiorda
CONSEQUÊNCIAS PSICOLÓGICAS PÓS-ABORTO
Dr. Sérgio Luis da Silva Lopes – médico psiquiatra, presidente da Associação Médico Espírita de Pelotas (AME-PELOTAS-RS)
Dr. Flávio Braun Fiorda – médico psiquiatra, presidente da Associação Médico Espírita de Santos ( AME-SANTOS-SP) e presidente SBTVP
“Admitimos seja suficiente breve meditação, em torno do aborto delituoso, para reconhecermos nele um dos fornecedores das moléstias de etiologia obscura e das obsessões catalogáveis na patologia da mente, ocupando vastos departamentos de hospitais e prisões[C1] ”...
- Emmanuel -
É ingênuo pensar que o aborto livra a mulher de um problema. As consequências emocionais de alguém que assume uma vida que foi gerada são completamente diferentes de alguém que escolhe a morte. Carregar por toda a existência o peso de um aborto é completamente diferente de compartilhar o nascimento e desenvolvimento de um filho. Isso serve para o homem também.
Os conflitos psicológicos mais angustiantes oriundos da chamada “gravidez indesejada” dizem respeito, na absoluta maioria das vezes, aos períodos iniciais da gestação, quando se descobre a gravidez fora dos planos. A chamada gravidez “na hora errada” dos dias de hoje fala-nos de uma realidade social na qual muitas mulheres julgam que ter um filho em determinado momento de suas vidas seria um obstáculo aos seus projetos pessoais mais imediatos. Também a frequente pressão do rapaz sobre a companheira para abortar, ou mesmo da família e, ainda o que é pior, o apoio à proposta abortiva sugerida por alguns médicos.
A pergunta que fica é:
- Qual é o momento ideal para se ter um filho nos dias atuais?
Considerando que, via de regra, em primeiro lugar está a profissão, depois a estabilidade financeira, depois a felicidade pessoal, depois um relacionamento com alguém que tenha o perfil ideal para ser um bom pai e um bom marido. Até aí transcorreram muitos anos e, comumente, a mulher chega a uma idade mais avançada onde ficar grávida já é bem mais difícil.
O ser humano, em geral, tem a tendência de fugir das dificuldades. Mais ainda quando se trata de decisões com particular importância, como a de se ter um filho. O problema que se impõe é que o aborto é uma saída infantil para “resolver” uma situação que já está posta. Cria-se a fantasia de que através do aborto “o problema” deixa de existir. Faz-se de conta que nada aconteceu.
Temos assistido a progressiva cultura da morte como solução. Isso faz parte de um processo global de banalização da vida, como se dispor da existência de alguém fosse algo sem tanta importância. Falamos de “alguém” porque o embrião e o feto, logo a seguir, já são alguém. Qualquer livro de embriologia ensina que a vida começa na fecundação, ou seja, a união da célula feminina, o oócito, com a célula masculina, o espermatozoide. Exatamente nesse momento o espírito reencarnante liga-se à matéria.
LIVRO DOS ESPÍRITOS Q. 344 Em que momento a alma se une ao corpo?
“A união começa na concepção, mas só é completa por ocasião do nascimento. Desde o instante da concepção o Espírito designado para habitar certo corpo a este se liga por um laço fluídico, que cada vez mais se vai apertando até ao instante em que a criança vê a luz. O grito, que o recém-nascido solta, anuncia que ela se conta no número dos vivos e dos servos de Deus.”
Alguns políticos e profissionais materialistas tentam tirar a importância dessa realidade, criando a ilusão de que o aborto é uma decisão como outra qualquer, que não envolva maiores consequências na vida dos envolvidos, particularmente da mulher que o pratica.
A prática clínica mostra uma realidade bem mais preocupante e que não é veiculada pelos movimentos pró-aborto que tanto defendem “os direitos das mulheres”. São inúmeras as consequências psicológicas diretas do abortamento provocado na existência atual.
Interessante a pesquisa realizada em Campinas-SP[A2] , publicada no Cad. Saúde Públ., Rio de Janeiro, 11 (1): 97-105, jan/mar, 1995, mostrando os sentimentos envolvidos na decisão de abortar:
“A população-alvo do estudo foi constituída de todas as funcionárias (7359) e alunas de graduação (2231) de uma universidade paulista. Quase metade das mulheres que abortaram disse que depois se sentiu mal emocional e/ou fisicamente (48,8%). Nesse caso, foram dadas respostas do tipo: “Muito triste”, “Deprimida”, “Depois foram nove meses de tortura”, “Complexo de culpa”, “Infeliz”, “Passei muito mal, vomitei, senti tontura”, “Tive cólicas”, “Um pouco indisposta”, “Enjoada”, “Mal-estar[A3] ”.
Essas emoções mencionadas são expressões conscientes , ou seja, aquelas que a pessoa se dá conta que está sentindo, porque tanto mais preocupantes são também aquelas expressões que se tornam inconscientes, com manifestações de diversos sintomas de natureza variada, especialmente psicossomáticas. Veremos um exemplo no caso clínico na sequência deste artigo.
É notório registrar igualmente o que disseram as mulheres que não levaram adiante o plano de abortamento.
“Do total de mulheres que não abortaram, mais de quatro quintos relataram ter-se sentido bem, feliz, aliviada e não arrependida por não ter feito o aborto. Foram dadas respostas do tipo: “Muito bem emocionalmente”; “Realizada”, “A pessoa mais feliz do universo”, “Me senti muito aliviada, pois sabia que não era isto que eu queria”, “Como se tivesse tirado um peso de cima de mim[A4] ”.
O nascimento de um filho confirma o que é natural para o psiquismo materno, ou seja, chegar ao final da gestação e “dar a luz”. A expressão comum já diz tudo, dar a luz. No aborto “apaga-se a luz” e a mãe, de certo modo, apaga-se junto. O alívio de ter enfrentado e vencido os problemas sociais e ambientais é justificável à medida que o psicológico acompanha o instintual. Quem decide abortar é a razão equivocada, nunca o instinto de conservação, que na acepção Espírita faz parte de uma Lei Natural. Pela pesquisa citada, a absoluta maioria das mulheres que não abortaram concluem a gestação aliviadas e felizes. Isso faz todo o sentido. Nada é mais compensador do que gerar uma vida. Nada mais frustrante do que protagonizar a morte.
Tão grave esse impasse que nesse estudo as autoras encontram que:
“Mais chamativo do impacto da culpa para a mulher que faz aborto é representado por 6% delas que, mesmo não havendo realizado a interrupção da gestação, sentiram-se culpadas e arrependidas[C5] .”
O fato de ter cogitado o aborto pode ser motivo de conflito psicológico futuro. Isso é confirmado pela prática clínica de atendimento em psicoterapia de mulheres que se tratam em função de relações de conflito com seus filhos já crescidos, mas que voltam a sentimentos secretos que tiveram durante a gravidez, cogitando se essas dificuldades não se devem a terem desejado tirar pelo aborto aquele filho que agora está dando problemas. De fato, não quer dizer que um filho com o qual se tenha dificuldades no presente se deva necessariamente aos sentimentos passados de rejeição na gravidez. Mas essa manifestação tão comum nas mães revela que, no imaginário de sua vida mental, restou a culpa de ter desejado livrar-se do filho em algum momento.
O Dr. Flávio Braun, médico psiquiatra e psicoterapeuta, presidente da Sociedade Brasileira de Terapia de Vida Passada (SBTVP) e da Associação Médico-Espírita de Santos-SP (AME-SANTOS), relata um caso muito ilustrativo do assunto que estamos tratando e que passamos a relatar a seguir:
A paciente X atendida em 2003, 29 anos, casada há 5 anos, profissional da área de saúde. Trouxe como queixa na primeira consulta sua insatisfação com o fato de não conseguir ser mãe biológica, de não engravidar pelos meios naturais e de não querer se submeter aos meios científicos modernos de profissionais especializados para a geração de gravidez em laboratório. Relatava estar muito depressiva, irritada, revoltada, culpando-se, achando-se incompetente para engravidar, com crescentes conflitos com o esposo que, conforme ela entendia, não a amava de verdade, fazendo sexo com ela somente para gerar um filho.
Ansiosa, controladora, querendo tudo para ontem, muito crítica com os outros, chegou à consulta quase num pré-surto psicótico, com olhar choroso e ideação suicida, pedindo ajuda.
A anamnese prosseguiu noutro dia onde revelou ter muitos sonhos repetitivos em épocas antigas e variadas onde saía com vários parceiros e os traía sem abalos pessoais, engravidando, abortando uns e abandonando outros filhos pelo mundo afora, demonstrando traços de indiferença, egoísmo e prepotência de um suposto passado. E como sabemos, com a hipótese da reencarnação, que sonhos repetitivos podem ser indicadores importantes sobre o histórico reencarnatório da pessoa. Relatou ter tido dois abortos espontâneos do mesmo companheiro em 2000 e 2001, o que a deixava arrasada só em relembrar estes assuntos, já que ambos ansiavam por terem filho logo. Mas ao mesmo tempo sentia-se forçada a confessar a mim, e o fez na terceira sessão, que já havia praticado um aborto escondido, utilizando-se de medicação, ainda enquanto solteira de um ex-namorado na época da faculdade, após saber do resultado de exame de sangue positivo para gravidez. Fato este que levava em segredo absoluto, pois sentia muita vergonha do feito, abrindo-se num desabafo em confessionário médico, sendo eu a única pessoa a saber, fora ela mesma. O primeiro passo para o seu caminho do reequilíbrio foi abrir-se e falar a verdade. No seu mundo interno um enorme complexo de culpa que carregava pelo ocorrido há 9 anos. Chegava a pensar que sua dificuldade de engravidar agora era um justo, porém pesado, castigo de Deus. Foi um longo processo terapêutico, com muitas outras sessões de orientação com apoio moral e algumas das sessões com regressão de memória, onde afloraram algumas histórias parecidas como as dos sonhos repetitivos que tinha quase sempre, gerando uma virada psicólogica importante pela tomada de consciência de outras origens de sua culpa e dificuldades atuais, melhorando aos poucos, pela brandura e pela resignação.
Em exame de rotina nesta fase, descobriu ser portadora de endometriose, que acomete as mulheres em idade reprodutiva e que consiste na presença de células endometriais em locais fora do útero. O endométrio é a camada interna do útero que é renovada mensalmente pela menstruação. É um transtorno ginecológico comum, atingindo entre 10% e 15% das mulheres em idade reprodutiva, doença que pode dificultar a ocorrência de uma gestação. Foi então operada por vídeolaparoscopia para resolução do caso, aceitando dois meses depois o tratamento por fertilização in vitro. Da primeira vez sem sucesso, o que a consumia em suas poucas esperanças, nos raros momentos de aproximação do casal. E com sucesso pela segunda vez, alguns meses a seguir daquele mesmo ano. Gerando uma vida, vindo a gestação a termo, sem intercorrências, até a nova mãe e o novo pai poderem ter em seus braços seu maior desejo realizado e praticarem com o ser recebido os mais elevados atos de amor da criação humana.
Esse belo caso fala-nos das consequências globais do abortamento provocado. Além das repercussões da culpa, o desequilíbrio emocional que desalinhou o seu relacionamento com o marido, culminando com as ideias suicidas. O aborto escondido para o mundo não ficou oculto para a consciência, ocasionando o autoflagelo psicológico. Não estamos analisando aqui os possíveis concomitantes espirituais de natureza obsessiva, que normalmente acompanham esses casos.
É de chamar a atenção a endometriose existente. Terá sido promovida pelo processo psíquico subjacente desta e de vidas passadas, deixadas por lesões perispirituais? Não temos como afirmar, mas temos como suspeitar, com fortes evidências, de um processo conjunto de natureza psicossomática.
Por fim, a terapêutica bem conduzida do Dr. Flávio proporcionou um desfecho feliz para o drama desse casal que parece ter aprendido as lições vivenciadas, ressignificando a dor emocional.
Poderiam não ter conseguido efetivar uma nova gestação, como muito casais. Nesse caso não devemos esquecer a sublime via da adoção, lembrando que a reencarnação efetiva os laços da família espiritual através de muitos mecanismos. Conforme o Evangelho Segundo o Espiritismo[A6] :
“Os verdadeiros laços de família não são, pois, os da consanguinidade, mas os da simpatia e da comunhão de pensamentos que unem os Espíritos antes, durante e após a sua encarnação.”
É assim então que nós, espíritos eternos, nos revezamos no palco das encarnações sucessivas, ora ocupando a posição de pais, ora desempenhando o papel de filhos, aprendendo gradativamente as lições mais profundas do amor. Não optar pelo aborto intencional, que é fuga egoísta de um dever previamente assumido, é passo evolutivo de maturidade, pois se achegam ao convívio familiar, pela reencarnação, grandes desafios de resgate e aprendizado.
BIBLIOGRAFIA:
1. Xavier. F. ( Pelo espírito Emmanuel). FEB, 5ª Ed. Rio de Janeiro, 1981. Cap 17, pag 76.
2. Centro de Pesquisas das Doenças Materno-Infantis de Campinas. Caixa Postal 6181, Campinas, SP, 13081-970, Brasil.
Departamento de Tocoginecologia, Faculdade de Ciências Médicas, Universidade Estadual de Campinas. Caixa Postal 6181, Campinas, SP, 13081-970, Brasil.
Cad. Saúde Públ., Rio de Janeiro, 11 (1): 97-105, jan/mar, 1995
3. Cad. Saúde Públ., Rio de Janeiro, 11 (1): 97-105, jan/mar, 1995, pag. 98.
4. Cad. Saúde Públ., Rio de Janeiro, 11 (1): 97-105, jan/mar, 1995, pag 105.
5. Cad. Saúde Públ., Rio de Janeiro, 11 (1): 97-105, jan/mar, 1995, pag 105.
6. (Kardec, A. O Evangelho Segundo o Espiritismo, 142ª Ed. IDE, 1978. Cap XIV)
[C1]Xavier. F. ( Pelo espírito Emmanuel). FEB, 5ª Ed. Rio de Janeiro, 1981. Cap 17, pag 76.
[A2]1 Centro de Pesquisas das Doenças Materno-Infantis de Campinas. Caixa Postal 6181, Campinas, SP, 13081-970, Brasil.
2 Departamento de Tocoginecologia, Faculdade de Ciências Médicas, Universidade Estadual de Campinas. Caixa Postal 6181, Campinas, SP, 13081-970, Brasil.
Cad. Saúde Públ., Rio de Janeiro, 11 (1): 97-105, jan/mar, 1995
[A3]Cad. Saúde Públ., Rio de Janeiro, 11 (1): 97-105, jan/mar, 1995, pag. 98.
[A4]Cad. Saúde Públ., Rio de Janeiro, 11 (1): 97-105, jan/mar, 1995, pag 105.
[C5]Cad. Saúde Públ., Rio de Janeiro, 11 (1): 97-105, jan/mar, 1995, pag 105.
[A6](Kardec, A. O Evangelho Segundo o Espiritismo, 142ª Ed. IDE, 1978. Cap XIV)
Sobre o Autor(a) deste Artigo
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Flávio Braun Fiorda
Psiquiatra, Didata, Supervisor, Orientador, Autor, DIretor de Cursos e Pres
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